Na última semana o vírus Epstein-Barr (EBV, da sigla em inglês) entrou em evidência após vários veículos de imprensa publicarem que a cantora Anitta afirmou ter sido diagnosticada com EBV. Muitos comentários e dúvidas foram levantados acerca deste vírus.
Conhecido também como causador da “doença do beijo” (mononucleose), o vírus é mais comum do que se imagina. Mais de 90% da população mundial foi ou será infectada em algum momento da vida pelo EBV. Na maioria da vezes, esse vírus pode permanecer latente (inativo) no organismo.
Importante reforçar que, em muitos dos casos os sintomas são leves em crianças e adultos. A notícia não deve gerar pânico, uma vez que a doença é multifatorial, depende de fatores ambientais, do sistema imunológico e da predisposição genética de cada paciente.
A Sociedade Paulista de Reumatologia, por meio da reumatologista pediátrica Dra. Daniela Gerent Petry Piotto, membro da Comissão de Reumatologia Pediátrica da SPR e prof. afiliada ao Departamento de Pediatria da UNIFESP, responde as principais perguntas e informa sobre como o vírus EBV pode agir em pacientes com algumas doenças autoimunes.
O que é EBV?
O vírus Epstein–Barr (EBV) faz parte da família da herpes, especificamente o herpesvírus humano tipo 4. É um vírus comum, principalmente em crianças, adolescentes e adultos jovens.
Estima-se que cerca de 50% das crianças até 5 anos de idade e 95% dos adultos já tiveram contato com esse vírus (fonte: Manual dos Médicos MSD – dados EUA, pois no Brasil são poucos dados epidemiológicos sobre esta infecção).
Como é transmitido?
A transmissão ocorre principalmente através da saliva, pelo beijo. Mas também pode ocorrer por meio de objetos contaminados, transfusão sanguínea ou via transplacentária, quando a gestante adquire o vírus durante a gravidez e passa ao feto pela placenta.
Na infância, a transmissão pode acontecer quando um pai ou uma mãe beija o filho na “boca”, por isso é importante evitar dar selinho nos bebês e nas crianças.
O período de incubação do vírus, ou seja, o tempo que decorre do contato com o vírus e até início dos sintomas, é longo, em torno de duas a três semanas, em média. A pessoa pode ter o contato com o vírus, permanecer assintomático e mesmo assim ainda pode transmitir o vírus a outras pessoas.
Quais os sintomas?
Os mais frequentes são: febre, dor de garganta e inflamação dos gânglios do pescoço. Também pode manifestar cansaço, dor no corpo, dores musculares, fadiga, tosse, perda de apetite, aumento do baço e do fígado, manchas vermelhas pelo corpo e até mesmo icterícia (pele amarelada).
Complicações neurológicas são raras, mas podem incluir encefalite, convulsões, síndrome de Guillain-Barré, neuropatia periférica, meningite viral, por exemplo, com sintomas de dor de cabeça, confusão mental, febre e vômitos.
Na maioria das vezes a mononucleose é uma doença benigna que pode ser assintomática ou facilmente confundida com outras doenças respiratórias comuns no inverno, principalmente em crianças.
Importante lembrar que nem todas as pessoas que contraem o EBV terão sintomas.
Como é feito o diagnóstico?
Através da suspeita da doença por sinais e sintomas típicos, como febre, dor de garganta, placas de exsudato (aspecto esbranquiçado) na garganta e faringe, gânglios aumentados e dolorosos no pescoço, aumento do fígado e baço, por exemplo.
Exames de sangue também podem auxiliar na confirmação do diagnóstico, como o hemograma que analisa a presença de glóbulos brancos com forma anormal, chamados de linfócitos atípicos, e um exame de sangue específico que pesquisa a presença de anticorpos contra o vírus Epstein-Barr (sorologia).
Quais doenças o Epstein-Barr pode causar?
A mononucleose é a doença mais comum, mas o EBV pode estar associado também à pneumonite, a quadros hematológicos como anemia hemolítica e pancitopenia, e a alguns tipos de cânceres não muito comuns, como o nasofaríngeo e o gástrico, além de alguns tipos de linfoma (Burkitt e Hodgkin). O EBV também pode causar encefalites, meningites e outras complicações neurológicas já mencionadas.
Como o Epstein-Barr pode atuar nas doenças autoimunes?
Os vírus, em especial o EBV, desempenham um papel importante nas doenças autoimunes, agindo como gatilho no surgimento de uma nova doença ou reativação da atividade de uma doença já existente, principalmente em indivíduos imunocomprometidos, como nos pacientes com doenças reumáticas autoimunes. A gravidade da doença está relacionada ao grau de imunossupressão e o seu efeito na resposta imunológica de cada paciente.
Um estudo publicado na revista “Nature”, em 2018, feito pelo Hospital Infantil de Cincinnati (EUA), mostrou como a exposição ao EBV aumenta o risco de desenvolver doenças autoimunes em pessoas com predisposição genética, como o lúpus eritematoso sistêmico, esclerose múltipla, artrite reumatóide, artrite idiopática juvenil, doença inflamatória intestinal, doença celíaca e diabetes tipo 1.
Como é o tratamento?
Ainda não existe uma vacina específica. O tratamento da mononucleose é sintomático, ou seja, procura aliviar os sintomas, com o uso de antitérmicos para febre, analgésicos para dor de garganta,hidratação e repouso.
No caso de pacientes com doenças reumáticas autoimunes, a Sociedade Paulista de Reumatologia recomenda o acompanhamento de um reumatologista.