Rafael Cervone, presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), espera que a votação da reforma tributária sobre o consumo na Câmara dos Deputados, prevista para os próximos dias, corrija as distorções acrescentadas ao texto da PEC 45 durante sua tramitação. “É preciso retirar todos os puxadinhos referentes a exceções e benefícios indevidos, pois esses privilégios, se mantidos, farão com que a maioria dos contribuintes pague mais”.
Há dois cenários mais factíveis referentes aos níveis de taxação, com base em análises de técnicos do Ministério da Fazenda, salienta Cervone. No primeiro, a alíquota somada do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), sem nenhuma exceção além do Simples Nacional e do tratamento favorecido à Zona Franca de Manaus, seria de no máximo 22%. No segundo caso, considerando descontos de 50% para agropecuária e cesta básica, serviços de educação e de saúde privada, chegaria a cerca de 24%.
“Porém, se contempladas todas as demais exceções preconizadas por distintos segmentos, introduzidas no Senado, a alíquota projetada pode ultrapassar 27%. É um índice muito elevado e prejudicial à meta de um vigoroso crescimento sustentado. Seriam subvertidos os objetivos de proporcionar ao País um modelo tributário racional, equânime e menos dispendioso para a sociedade”, afirma o presidente do Ciesp, ressaltando: “Esse nível de taxação reforça a posição do Brasil como uma das economias nas quais a tributação do consumo proporcional ao PIB é das mais elevadas do mundo”.
Dentre as distorções a serem corrigidas, Cervone enfatiza a prorrogação até 2032 de incentivos fiscais à produção de quaisquer tipos de veículo a combustível Flex, sem priorizar a aplicação de novas tecnologias dos automóveis eletrificados, conforme consta no Parágrafo 3º do Artigo 19 da PEC 45. A extensão do benefício foi introduzida no Senado.
A justificativa para a medida (os gastos vultuosos de recursos públicos para desenvolvimento de novas tecnologias e produtos) não tem lógica. “Na verdade, trata-se de um subterfúgio para manter privilégios usufruídos por fábricas já instaladas no País”, pondera o presidente do Ciesp, lembrando que a entidade já havia manifestado firme posição contrária à reintrodução na PEC 45 do Artigo 19, retirado do texto na primeira votação na Câmara dos Deputados. O dispositivo, que prorroga até 2032 os incentivos fiscais para indústrias do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste, em especial as automotivas, foi ainda mais agravado pelo novo teor do Parágrafo 3º, prejudicando o parque fabril paulista e de vários outros estados.
Os estímulos tributários para a instalação de montadoras e fornecedores de autopeças no Norte, Nordeste e Centro-Oeste constam da Política Automotiva para o Desenvolvimento Regional (PADR). Baseiam-se no mecanismo de concessão de crédito presumido do IPI para compensação com o montante a ser recolhido. Deveriam ter sido extintos em 2010, mas, depois de três prorrogações, expirarão somente em 2025 e, agora, há o risco de serem estendidos até 2032. “O mais preocupante e paradoxal é que, segundo Relatório de Auditoria realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU), não têm produzido resultados positivos”, frisa Cervone.
Cide Zona Franca, um novo IPI
Outro sério problema é a proposta contida no texto do relator da PEC 45 no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), que institui uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incidente sobre a produção e comercialização de bens que tenham a industrialização incentivada na Zona Franca de Manaus. Com isso, tudo o que for fabricado no País com similar no parque fabril manauara será taxado.
“Cria-se, assim, um novo IPI, cuja extinção é uma das premissas básicas da reforma tributária e do conceito de imposto único, para se conceder mais um benefício a uma região que já conta com numerosos incentivos”, alerta o presidente do Ciesp, explicando: “Ademais, a receita dessa nova Cide será destinada à subvenção da manufatura incentivada na Zona Franca, dobrando seus efeitos, em prejuízo da competitividade da indústria de todo o Brasil. Para São Paulo, onde o setor tem peso relevante na economia, os danos seriam maiores. É preciso rever esse adendo do relator, que é do Amazonas”.
Cervone afirma que “as exceções são muito nocivas ao País e à indústria, que paga mais impostos do que os demais setores e continuará sendo prejudicada se todos os “puxadinhos” introduzidos na PEC 45 não forem extirpados”. Para ele, “é inadmissível que, à custa de mais impostos e de recursos públicos que poderiam ser aplicados em saúde, educação, habitação e outras prioridades, incluindo iniciativas para o desenvolvimento regional, os contribuintes e o Estado continuem subsidiando políticas que proporcionam privilégios”. Por isso, conclui, “todos os benefícios indevidos e injustificados precisam ser eliminados pela Câmara dos Deputados”.